terça-feira, 21 de junho de 2011

O PRÍNCIPE DESENCANTADO


O primeiro beijo foi dado por um príncipe numa princesa que estava dormindo encantada há cem anos. Assim que foi beijada, ela acordou e começou a falar    - Muito obrigada, querido príncipe. Você por acaso é solteiro?
    - Sim, minha querida princesa.
    - Então nós temos que nos casar já! Você me beijou, e foi na boca, afinal de contas não fica bem, não é mesmo?
    - É... minha querida princesa.
    - Você tem um castelo, é claro.                                                  
    - Tenho... princesa.
    - E quantos quartos têm o seu castelo, posso saber?
    - Trinta e seis.
    - Só? Pequeno hein! Mas não faz mal, depois a gente faz umas reformas... Deixa eu pensar quantas amas eu vou ter que contratar... Umas quarenta eu acho que dá!
    - Tantas assim?
    - Ora, meu caro, você não espera que eu vá gastar as minhas unhas varrendo, lavando e passando não é?
    - Mas quarenta amas!
    - Ah, eu não quero nem saber. Eu não pedi para ninguém vir aqui me beijar, e já vou avisando que quero umas roupas novas, as minhas devem estar fora de moda, afinal, passaram-se cem anos, não é mesmo? E quero uma carruagem de marfim, sapatinhos de cristal e... E... Jóia é claro! Eu quero anéis, pulseiras, colares, tiaras, coroas, cetros, pedras preciosas, semipreciosas, pepitas de ouro e discos de platina!
     - Mas eu não sou o rei das Arábicas sou apenas um príncipe...
     - Não me venha com desculpas esfarrapadas! Eu estava aqui dormindo e você veio e me beijou e agora vai querer que eu ande por aí como uma gata borralheira? Não, não e não, e outra vez não e mais uma vez não!
     Tanto a princesa falou, que o príncipe se arrependeu de ter ido até lá e beijado. Então, teve uma idéia. Esperou a princesa ficar distraída, se jogou sobre ela e deu outro beijo, bem forte. A princesa caiu imediatamente em sono profundo, e dizem que até hoje está lá, adormecida. Parece que a notícia se espalhou e os príncipes passam correndo pela frente do castelo onde ela dorme, assobiando e olhando para o outro lado.
Flávio de Souza. Príncipes e princesas, sapos e lagartos.
São Paulo, FTD, 1993.

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